21 sept 2009

El arte de la impostura



A  arte da impostura.
Alejandro Dolina


O homem de nossos dias vive tentando causar uma boa impressão. Seu principal desvelo é a aprovação alheia. Para consegui-la existem diferentes métodos e estratégias.
Alguns exercem a inteligência, outros decidem pela tenacidade ou a beleza, outros cultivam a santidade ou a coragem.
No entanto, por ser todas estas virtudes muito difíceis de cumprir, certos trapaceiros se limitam a fingi-las. Claro que também não é simples: o engano é uma disciplina que exige atenções e cuidados permanentes.
Por sorte para os hipócritas e simuladores, existe desde há muito tempo o Serviço de Ajuda ao Impostor.

1- Baseados em modernos critérios científicos, os especialistas da organização instruem, aconselham, ditam aulas, remexem casos particulares e difundem as técnicas mais refinadas para obter aparências de proveito. Quando algum pé rapado quer presumir de elegante, o Serviço lhe recomenda alfaiates, loções e gravatas. Quando se trata de aparentar cultura, o cliente tem à sua disposição frases feitas, aforismos brilhantes e gestos de suficiência. Os que pretendem passar por corajosos são adestrados na arte da fleuma e da malandragem. Muitos pobres praticam para se fingirem de ricos, e muitos ricos se esforçam por parecerem indigentes. Devemos dizer que alguns postulantes são muito burros e não chegam a completar os cursos. Outros têm características tão marcadas que acaba sendo impossível dissimulá-las. Durante muitos anos, os hipócritas desaprovados deveram se resignar a mostrar cruamente as suas verdadeiras e abomináveis condições, ou bem serem descobertos em suas torpes fraudes. Mas com o tempo, o Serviço encontrou uma fórmula drástica para socorrer aos menos favorecidos. Assim nasceu a substituição como recurso extremo. Imaginemos um moreno tentando infrutuosamente ingressar num seleto clube noturno. O homem fracassa com as tinturas e maquiagem. Imediatamente o serviço designa um loiro de pés a cabeça em sua substituição. O impostor entra sem problemas e em nome do moreno rejeitado, dança e se diverte a noite toda.
Os exemplos são inúmeros: estudantes medíocres que se fazem substituir nas provas; apaixonados tímidos que – como Cyrano de Bergerac – mandam em seu lugar um mulherengo; empregados capazes que para conseguir um Ascenso enviam um lambe-botas e pessoas fartas da sua família que se fazem substituir nos aniversários.

O Serviço de Ajuda ao Impostor foi aperfeiçoando a tecnologia da substituição com disfarces impecáveis. Suspeita-se que, hoje em dia, a maioria das pessoas com quem tratamos são na verdade agentes da organização. Nossos amigos, nossas namoradas, nossos governantes e nossos cunhados podem ter sido substituídos por impostores profissionais. Talvez eu mesmo esteja fingindo escrever estas minúcias a nome e beneficio de um cliente chamado Dolina. Talvez você, que finge me ler, esteja substituindo alguém que não se atreve a confessar que os mitos de Flores já estão enchendo o saco.

2- Os governos, do mesmo modo que as pessoas particulares, vivem preocupados pela opinião dos de fora. Continuamente sugerem à população a necessidade de melhorar o que se chama imagem exterior.
Para consegui-lo, promove-se a difusão de nossos aspectos mais brilhantes. Quando nos visitam os estrangeiros, lhes mostram nossos recantos mais apresentáveis, dão-lhe um pastel e lhes obrigam a escutar a orquestra de Osvaldo Pugliese.
A exaltação dos nossos méritos vai quase sempre acompanhada de um cuidadoso dissimulo de nossos defeitos. Além disso, com o objeto de aparentar e faltando estrangeiros, se acostuma dar bandeira ante os próprios conterrâneos.
Com toda insistência, se assinala que os médicos argentinos são os melhores do mundo, para não mencionar os doentes. Quando se produz algum defeito em uma transmissão internacional, os locutores se apressam a esclarecer que o problema se originou no satélite alemão, com o qual ficamos tranqüilos.
A atitude temerosa do julgamento alheio é proverbial no jornalismo. Há pouco tempo uma cronista aproveitou sua passagem por Roma para consultar os transeuntes italianos acerca de nossa nova situação institucional. Os telespectadores receberam várias reflexões, expressadas em geringonça que, em geral, nos perdoavam a vida. Ao final da enquete, a cronista não podia ocultar a sua satisfação. Havíamos passado a difícil prova de agradar os sorveteiros da Via Marguta.
Não estaria mal recorrer ao Serviço de Ajuda ao Impostor para aperfeiçoar nossas representações perante estranhos.
A solvência da organização nos permitiria aparentar qualquer coisa: que temos 100 milhões de habitantes, que somos prósperos, que somos poderosos. Poderiam editar censos adulterados e mapas fraudulentos que nos mostrem no dobro da nossa extensão.
Manuel Mandeb recomendou alguma vez a conveniência de nos fingirmos o Japão, para desconcertar nossos inimigos. O pensador de Flores propunha que todos nos esticássemos os olhos com os dedos e falássemos pronunciando os “erres” como “eles”.
Assim nos alcança uma dúvida: não será que outros países já nos estão enganando? A citada potência norte-americana pode ser nada mais do que uma ficção criada pelos impostores do Norte. Talvez Suécia seja um país tropical, mas dissimula. Quem sabe a União Soviética seja uma pequena república da África e Luxemburgo é na verdade o maior país do mundo.
Em todo caso, antes de encarar qualquer ação para melhorar a nossa imagem exterior, é indispensável decidir qual é a sensação que queremos deixar. Se dispersarmos os nossos esforços em simulações diferentes e desconectadas, os resultados serão mais bem confusos. Diga-se de uma vez o que fingiremos ser: uma nação tranqüila? Uma nação exaltada? Uma nação limpa? Uma nação anglo-falante?
Os tratadistas reconhecem três tipos de impostura: horizontal, ascendente e descendente. A última consiste em se mostrar pior do que é. E não faltam economistas que postulam este caminho para despertar a comiseração internacional.

3- Os teóricos mais barrocos do Serviço acreditam que a impostura é uma arte. E mais ainda: afirmam que toda arte é uma impostura. Cem gramas de pintura ao óleo nos aparecem com um rosto misterioso ou como uma paisagem lunar. Quinhentos gramas de bronze pretendem ser o corpo de Hércules. Uma curiosa combinação de tintas e papéis é apresentada como a alma de um homem atormentado.
Somente a música está livre de simulações. Um acorde em mi menor é precisamente isso e não pretende ser nada mais.
Os teóricos também defenderam o caráter ético da impostura ascendente. O argumento principal não é novidade: de tanto aparentar bondade, a gente acaba sendo bom.
Falta nesta monografia dados concretos que permitam ao leitor a contratação do Serviço. Lamentavelmente não é possível fornecê-los.
Para começar, ninguém sabe qual é a localização da entidade. Às vezes o local assume o aspecto de um armazém. Outras vezes, aparece como um bar ao passo, ou como uma estação ferroviária. Os impostores são sempre conseqüentes com as suas representações e por mais que lhes expliquemos as nossas necessidades, insistem em vender feijão, servir genebra ou despachar uma passagem de ida-e-volta a Caseros.
É verdade que freqüentemente aparecem impostores oferecendo seus serviços. Mas a organização já advertiu ao público que se trata na verdade de falsos impostores que devem ser denunciados à polícia.



4- Sabe-se lá quantos ridículos passos de dança teremos feito nós para agradar polacos e coreanos.
Estaremos bem? Não seremos uma nação fora de lugar? Que pensarão de nós estes visitantes holandeses? Gostou de nossa estrada, senhor Smith? Cuidado dissimule que aí vem um francês! Não estaremos destoando no concerto internacional?
Eu acredito que talvez não importe destoar num concerto que parece dirigido pelo Diabo.
Vale a pena tentar o caminho difícil, o mais penoso, o mais longo, mas também o mais seguro. É o caminho da verdade. Quem queira parecer honesto, que o seja. Quem queira fama de valente, que ganhe à força de coragem. E se queremos que o mundo pense que somos uma grande nação, saibamos que o mais conveniente é ser deveras uma grande nação.
Enquanto chegam esses tempos, poderíamos começar a fingir que não fingimos.



2 comentarios:

  1. eu acho ese escritor maravilhoso. Já traduzi 10 das crônicas dele... falta outro tanto rsrsrsrs

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